domingo, 25 de abril de 2010

25 de Abril Sempre, Fascismo Nunca Mais!

25 de Abril de 2010
A pergunta mais comum neste dia é: "Onde é que estava no 25 de Abril de 1974?" bem para mim esta é uma pergunta, supostamente fácil, pois eu, feliz ou infelizmente, ainda não existia. Resta-me então recorrer à minha imaginação e colocar-me neste passado tão remoto.
24 de Abril de 1974
06:50
Mais um dia primaveril na cidade da Covilhã, é muito cedo, mas espera-me um dia inteiro de trabalho. Se pudesse queixava-me desta vida monótona, mas parece que nem isso me é permitido, apesar de tudo as coisas cheiram a mudança, paira no ar um sentimento de revolta, contudo eu não passo de uma mulher, que é que sei de movimentos rebeldes? Absorta nestes pensamentos, parada sentada na cama a olhar a serra da minha janela...a porta do meu quarto abre, a minha mãe grita e pergunta-me se quero ser despedida?! Na minha mente a resposta é sim, mas o que reproduzo é bem diferente.
07:10-9:00
Preparo-me e vou a pé para a cidade, trabalho numa das poucas lojas da cidade, o horário é cansativo e o pagamento...enfim...dá para ajudar lá em casa e para ir ao cinema e ao teatro de vez em quando. Hoje por acaso vem cá uma companhia, que vem cá de 4 em 4 meses, eles são fantásticos, ou melhor ele... bem vou revê-los, que saudades.
09:20-13:00
O dia passa na normalidade, as senhoras finas da Covilhã a visitar a pequena loja, nós a atendermos com a maior da simpatia e dedicação e recebemos, por vezes, em troca desprezo...mas não me importo, pois sei que um dia tudo vai mudar e eu vou sair daqui.
13:10-14:15
Tenho que ir fazer o almoço para os meus pais que saem a esta hora das fábricas e para os meus irmãos que andam a estudar...a casa está silenciosa, demasiado para meu gosto, vou vasculhar os meus vinis e ei-lo, o meu vinil favorito trazido da minha tia de França, Juliette Gréco e sim preparo um arroz de atum ao som de Sous Le Ciel de Paris, canto pela pequena cozinha, danço, pela casa, uso a colher de pau como microfone...os meus 15 minutos de fama, sem ninguém para aplaudir.
De repente oiço a porta, tiro imediatamente o vinil, os meus pais não gostam que eu oiça música francesa.
O almoço decorre em silêncio, pois à mesa não se fala, arrumo a cozinha e saio de casa a correr, hoje janto num café lá perto para poder estar com os actores e meus amigos da companhia de teatro que sempre me tentam levar com eles...
15:00
À tarde chego à loja parece que hoje estou sozinha com o patrão, o que não me agrada nada...o olhar constante e descarado que me percorre o corpo, ser despida com os olhos...mal posso esperar a hora de saída.
19:00
Hora de ir para o café esperá-los, passo pela casa de banho para dar um jeito rápido ao cabelo e à maquilhagem . Quando volto à mesa já eles lá estão, corro para abraçá-lo, quero dizer abraçá-los e a amena cavaqueira começa...ali sou feliz, nos seus braços a ouvi-los atentamente e até a intervir.
21:00-22:45
Vou com eles e assisto à peça dos bastidores, sei o texto de cor, uma noite linda. Terminamos a noite a caminhar até minha casa, eles falam, sem medo, o que acho fenomenal, de um rumor de mudança...
22:55-00:00
Chego a casa, ligo muito baixinho o rádio e começo a ouvir o "E Depois do Adeus", canto baixinho enquanto fumo um cigarro à janela e vejo-os afastar-se de minha casa, repito então também baixinho para mim: mudança, mudança, mudança ...
00:20
Grândola Vila Morena
25 de Abril de 1974

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Ups !

Quando somos apanhados desprevenidos num turbilhão de emoções, planos (falhados ou não), dias inesqueciveis, outros para esquecer, colocamos em segundo plano coisas que nos fazem tão bem...
Tinha tantas ideias, tantos momentos que gostava de embelezar e gravar num local chamado Sapatos de Rebuçado. Sinto que me tinha esquecido do meu caminho até aqui, até ao sitío onde tudo é possível e ultimamente a razão pela qual não encontrava o caminho era por estar ocupada à procura do meu sapato de rebuçado que, literalmente, perdi. Ainda não o encontrei, mas ao menos consegui chegar aqui.
Tudo começou quando deixei a casa amarela pela última vez no dia 2 de Abril de 2009 e eu caminhava com o objectivo de chegar à fábrica de fazer sonhos, tudo por esta zona estava colorido repleto de personagens e eu deixei-me levar por elas...inspirei-me no mundo de sonho do Dr.Parnassus enquanto ele tentava enganar o diabo, perdi-me por trás daquele espelho mágico onde vi o meu imaginário! Um grande palco, com uma luz ténue à espera de ser ocupada, uma plateia ansiosa pela chegada...de Laura! Ouvia as palmas e os olhares solenes e toda eu estremecia...
Depois como que de repente alguém estalou os dedos e eu estava no bom caminho, mas quando dei por mim enfrentava um drama psicológico preocupante, estava isolada, numa ilha onde todos me faziam crer que era louca, um pesadelo, ou...uma verdade? De repente Shutter Island começou a ser destruída por um bando de monstrinhos liderados por um rapazinho desobediente, fugi, mas desnecessariamente, eram todos tão amigáveis!
Comecei a ouvir música, francesa, maravilhosa, voei até lá, uma rapariga tão entusiasmada como eu ouvia e cantarolava...fui com ela a Paris, fiz com ela parte de um esquema mesquinho, mas requintado, fui, com ela, magoada...esta história lembrou um romance de Janet Frame, aquela escritora tão pacata, recatada e talvez ingénua que deixava que lhe dissessem como viver a vida...
Revisitei mais uma vez aquela casa que transpira glamour e fui a nona mulher a cantar, chorar, gritar, brilhar naquele sitío, logo de seguida fui parar a um universo estranho e incestuoso de Jacques Demy E...POW...choveu muita coca-cola e houve um prenúncio de pipocas!
Estava cansada, mas ainda fui atraída por um charmoso chapeleiro para um chá interminável quando, lá muito ao fundo vi uma jovem negra, grávida, com ar de sofrimento, corri para ela e tentei ajudá-la pois ela carregava um ser, algo que há dezoito anos não acontecia.
De repente não havia mais universos para visitar, tudo se evaporava, de um momento para o outro. Quando retomei o meu caminho para a, por vezes, malfadada fábrica, vi que tinha perdido o meu sapato de rebuçado, ando desde então a tentar encontrá-lo...vim aqui redimir-me pela minha escassa presença e atenção e pedir...ajuda :(

Aos filmes da minha Páscoa e ao meu pé esquerdo ^^

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Espelho meu, espelho meu, haverá alguém mais belo do que eu?

Quando estamos rodeados de determinadas pessoas, num determinado local, a uma determinada hora, surgem também determinados assuntos, que se não estivessem reunidas as condições perfeitas, nunca na vida nos lembraríamos de tal coisa.

Pois as condições que levaram a esta ideia são fáceis de reunir, basta um adorável grupo de cinco amigos, numa casa em Lisboa, mais precisamente Linda-Velha (751), um quarto de casal, porta fechada, madrugada, muitos pijamas, muitas gargalhadas, uns encostados à cabeceira, outros no local oposto, cartas espalhadas, cigarros apagados no cinzeiro, pessoas sonolentas, outras nem por isso...imaginem portanto diálogos entre sonâmbulos e seres bastante despertos, misturar duas dimensões: a realidade e o sonho!

Ora o assunto que mais me fascinou nessa noite de deboche saudável, foi quando alguém, já não sei porquê, indagou "E se nos apaixonássemos por nós mesmos?".

Essa ideia pairou na minha mente os próximos dias e tive oportunidade de reflectir um pouco. Normalmente nunca se fala desse amor, pois não é considerado amor, mas talvez egocentrismo, fala-se de Narciso e da sua obsessão pelo seu aspecto que o levou à morte por afogamento, mas o que eu agora estou a tentar fazer é imaginar não este amor físico, mas sim um amor muito mais profundo...será possível alguém apaixonar-se por si próprio...crescer sempre à procura de alguém inteligente, que goste das mesmas coisas que nós e nos mostre outras, alguém sensível, romântico, dado à discussão (este é um ideal, entre muitos, claro). Uma procura incessante que só leva a relações falhadas e desgostos amorosos. E se este ideal tão desejado estiver tão perto de nós que não o conseguimos ver?! Esta pessoa está connosco constantemente e eternamente, nunca nos poderá deixar, nascemos juntos e morremos juntos e para a vermos basta uma superfície polida o suficiente...Chamem-me lunática...chamem a esta interrogação uma abominação, mas será assim tão ilógico? Não julguem esta ideia já, antes de o fazerem, vejam-se ao espelho...

- .... . . -. -..