segunda-feira, 22 de março de 2010

Querido Diário...

Acho que já aconteceu, de certeza, a toda a gente tropeçar nuns livros velhos que lá andam aos caídos pelo sótão da casa e reparar que um deles tem um cadeado de um pormenor que o torna quase tão belo como a capa dura que envolve aquelas finas cento e poucas páginas.
E apesar da tarefa que nos compete ali ser a de limpar o sótão, passamos tudo para segundo plano pela leitura de algo privado e até proibido, a tentação do fraco ser humano vem ao de cima nestas alturas.
Arrasto uma almofada, sacudo o pó que a cobre e sento-me, quando estou pronta para aquele pequeno e simples guardador de segredos, almas, vidas, me revelar uma personagem que vivia numa altura mais simples ou mais complicada, com uma vida glamoureuse ou não, repleta de paixões ou não...deparo-me com um pequeno GRANDE problema, não tenho a chave que me iria transportar para outra dimensão!
Desilusão total...claro que o que dava vontade de fazer era deixar o instinto animal dominar a minha racionalidade e despedaçar por completo aquele entrave! Não o fiz por respeito, consegui-me controlar, pensei no carinho que o autor daquele diário depositou naquelas páginas. Apesar de me sentir triste por não poder agora ter o privilégio de ler as confissões de um anónimo não desisti imediatamente.
Sentei-me e pensei em todas as minhas opções:
a) Destruir o pequeno cadeado e tirar a beleza do conjunto confissões/capa dura/cadeado;
b) Experimentar com um alfinete abrir a fechadura;
c) Encontrar uma chave que poderia nem existir.
A primeira estava fora de questão...fui então à caixinha da costura, que por sinal também estava coberta de pó (notável falta de uso), tirei um alfinete, corri para o sótão outra vez e tentei o meu recente chico-espertismo...expectativa...nada. Devo admitir que nunca tive jeito para a trafulhice, infelizmente, neste caso.
Só me restava virar de pantana aquele sótão e se necessário toda a casa! Comecei pelos caixotes, caixas e caixinhas...nada...gavetões, gavetas e gavetinhas...nada...debaixo de todos os almofadões, almofadas e almofadinhas...debaixo de todos os sofás...em cima de todos os armários...nada! Desarrumei a casa toda...nada... De repente, o meu pé, incontrolável pontapeou tudo o que encontrou, dei por mim a saltar nas frágeis tábuas do sótão e uma cedeu! Quando tirei o meu pé vi algo a brilhar naquele novo buraco, era uma chave ... seria a chave...?!
Peguei no diário, fiz deste um momento extremamente solene, ajoelhei-me e assim prostrada no chão rodei lentamente a chave, o meu coração acelerou, estava a um segundo de uma outra vida, quando abri o pequeno diário, folheei-o de uma vez só e, para meu espanto foi na primeira página que encontrei o único sinal de tinta: "Querido Diário..."
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